Casos

ACP FEPAGRO – dano ambiental por queimada (RS)


 


 


 

Número do processo:
5001723-09.2014.404.7120
Classe processual: 
ação civil pública
Órgão judicial: 
1.ª Vara Federal de Santiago (Rio Grande do Sul)
Abrangência: 
Local (imóvel específico)
Data de ajuizamento: 
16/05/2012
Status: 
cumprimento de sentença de parcial procedência

 


 


 

Polo ativo: 

Ministério Público do Rio Grande do Sul – MP/RS (originário)
Ministério Público Federal – MPF (após declínio de competência)

Polo passivo: 

Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária - FEPAGRO
Estado do Rio Grande do Sul

Terceiros/interessados: 

Assistentes simples do MPF:
- Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA
- União


 


 


 

Técnicas processuais: 
audiência de instrução, chamamento de interessados, intimação de autoridade pública para cumprimento, multa coercitiva
Temática: 
meio ambiente

 

Resumo:

Em 16/05/2012, o MP/RS ajuizou ação civil pública em face da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária - FEPAGRO, requerendo a responsabilização da fundação e reparação dos danos ambientais em razão da ocorrência de queimadas em área ocupada pela instituição na localidade de Itaperaju, Campo da Semente, 1º Distrito do Município de São Borja, Estado do Rio Grande do Sul.

A ação foi proposta originariamente na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (2.ª Vara Cível de São Borja), com base nas apurações de inquérito civil público instaurado após representação feita pela Associação Samborjense de Proteção ao Ambiental Natural - ASPAN, sobre queimada ocorrida em 27/09/2007.

A FEPAGRO apresentou defesa sustentando que a queimada ocorreu por culpa de terceiros, de modo que não poderia ser responsabilizada.

Foi realizada audiência de instrução, com oitiva do responsável legal da ré e de uma testemunha, presidente da ASPAN, ocasião em que se verificou que a área em questão estava apenas sendo explorada pela FEPAGRO; a propriedade das área afetada pela queimada seria em parte da UFSM, com reversão à União e então ao INCRA para fins de reforma agrária. Em razão disso, houve declínio de competência em favor da Justiça Federal.

Remetidos os autos ao juízo federal, a magistrada determinou intimação do MPF para que se manifestasse sobre o feito, assumindo então a autoria da ação e ratificado integralmente os pedidos e a causa de pedir da ação civil pública, requerendo também: "(a) a juntada da digitalização da íntegra dos autos físicos oriundos da Justiça Estadual (n. 030/1.12.0002103-8, Comarca de São Borja-RS, n. CNJ 000521670.2012.8.21.0030); (b) a fixação da competência na Justiça Federal, perante a Subseção de Santiago-RS; (c) a intimação da União, da UFSM, do Estado do Rio Grande do Sul, do INCRA e da ASPAN – Associação São Borjense de Proteção ao Ambiente Natural – para os fins do art. 5º, § 2º, da Lei 7437/85 e, por fim, (d) a desistência das testemunhas pendentes."

O INCRA e a União manifestaram interesse em ingressar no feito na condição de assistentes simples, o que foi deferido.

Encerrada a instrução, sem a oitiva de outras testemunhas, o MPF apresentou memoriais, aos quais aderiu a União. A FEPAGRO não se pronunciou, e o processo foi então sentenciado.

Os pedidos foram julgados parcialmente procedentes, determinando-se à FEPAGRO a reparação da área degradada. Entendeu-se que, "comprovada a atuação ilícita da FEPAGRO, consistente, no mínimo, em indevida omissão, e os danos ambientais que dela decorreram diretamente, também é evidente o nexo de causalidade. Assinalo, ainda, que a responsabilidade e a obrigação de reparar o dano podem ser atribuídas à requerida, por se encontrar, à época dos fatos, no domínio da área que pertence ao Poder Público Federal. Por conseguinte, surge o dever de recuperação ambiental (obrigação de fazer) e, eventualmente, o de indenizar os prejuízos causados (obrigação de dar, na modalidade pagar, como meio de compensação pecuniária), como corolário da responsabilidade civil objetiva, informada pela teoria do risco integral".

O caso foi enviado ao Tribunal Regional Federal da 4.ª Região em remessa necessária, sem alteração da sentença. Houve registro do trânsito em julgado em 11/03/2017.

Em 15/03/2017, o MPF requereu o cumprimento de sentença, diante do que foi apresentada impugnação pela FEPAGRO e pelo Estado do Rio Grande do Sul, especialmente em relação à multa coercitiva.

Em 06/07/2017, a impugnação foi rejeitada, registrando-se, porém, a necessidade de que a executada fosse intimada pessoalmente, nos termos da Súmula 410 do STJ. Determinou-se a intimação do Estado do Rio Grande do Sul, na pessoa do chefe do Poder Executivo, para cumprimento em até 60 dias, conforme determinado em sentença.

O Governador do Rio Grande do Sul foi pessoalmente intimado em 21/09/2017.

Em 25/01/2018, o Estado do Rio Grande apresentou Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD). O MPF foi intimado e reputou o PRAD adequado, pugnando, entre outras medidas, pela suspensão do feito por seis meses para implementação inicial.

Em 23/03/2018, o requerimento do MPF foi acolhido, determinando-se a suspensão do processo por seis meses e subsequente intimação do Governador do Estado do Rio Grande do Sul para comprovação da execução das medidas planejadas.

Em 03/06/2019, o Estado do Rio Grande do Sul apresentou manifestação sobre o cumprimento do plano de recuperação, diante do que o MPF se pronunciou no sentido de que o plano não foi executado, requerendo a manutenção da multa diária e o devido cumprimento.

Em 18/07/2019, foi proferida decisão, reputando que o plano ainda não foi cumprido por pender licença do órgão ambiental, em razão do que seria prematura a imposição da multa coercitiva. Determinou-se a intimação do executado para que esclarecesse o atual estado das providências administrativas.

Em 18/09/2019, o Estado do Rio Grande do Sul apresentou nova manifestação.

Em 10/10/2019, foi determinada nova suspensão do processo, por noventa dias, após o que o executado deveria ser intimado para esclarecer a situação da licença ambiental e, se o caso, comprovar a execução do plano.

Em 29/06/2020, foi prorrogada a suspensão, por quarenta e cinco dias, com posterior intimação do executado.

Atualmente, encontra-se em andamento prazo para manifestação do Estado do Rio Grande do Sul.


 

Pedidos:

Nos termos da petição inicial apresentada pelo MP/RS:

"1. a integral procedência da presente ação, para o fim de:

a. condenar os demandados ao pagamento de verba de indenização pelos danos ambientais causados, no valor de R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais), atualizados pelos índices oficiais até a data do efetivo pagamento, o qual deverá ser destinado a 6 companhia de Policiamento Ambiental – 2 Pelotão de Polícia Ambiental – PATRAM (art. 3, primeira parte da Lei n 7.347, de 24 de julho de 1985);

b. condenar o demandado ao cumprimento de obrigação de não fazer, consistente na abstenção de utilizar ou permitir que utilizem fogo ou queimada em atividade agropastoril, nas florestas e demais formas de vegetação natural, sem permissão/licença ambiental, executadas aquelas previamente comunicadas ao juízo, recomendadas/autorizadas/licenciadas previamente pelo órgão ambiental competente – DEFAP, sob pena de multa na razão de R$ 10.000,00 por evento e de responsabilização criminal, além das medidas judiciais necessárias para efetivação da tutela especifica, nos termos do art. 461 do Código de Processo Civil – art. 3, terceira parte, combinado com o art. 11, ambos da Lei 7.347, de 24 de julho de 1985.

c. condenar o demandado ao cumprimento de obrigação de fazer, para o fim de elaborar projeto de recuperação ambiental, no prazo de 60 (sessenta) dias, o qual terá de ser submetido à aprovação e licenciamento prévio pelo órgão ambiental competente – DEFAP, e deverá ter anotação de responsabilidade técnica (ART), de profissional habilitado, compreendendo a construção de aceiros e o manejo de campo com pastoreio constante, evitando o acúmulo de palha seca, bem como um plano de combate a incêndios, prevendo as medidas necessárias para a prevenção e combate de queimadas na área degradada. No projeto deverá haver previsão de cronograma de execução que não exceda o prazo de 01 (um) ano após a aprovação junto ao órgão ambiental competente. Ao término da execução do cronograma do projeto supramencionado, o demandado deverá comprovar em juízo todos os itens acima descritos através de laudo técnico de profissional habilitado e registro fotográfico semestral, tudo sob pena de multa na razão de R$ 5.000,00 por dia para a hipótese de descumprimento e de responsabilização criminal, além de medidas judiciais necessárias para a efetivação de tutela especifica, nos termos do art. 461 do Código de Processo Civil;"

Após o declínio de competência para a Justiça Federal, o MPF ratificou a petição inicial.


 

Tutela provisória: 

Não requerida.


 

Decisão final:

Nos termos da sentença de primeiro grau:

"Ante o exposto, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva, e no mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, para DETERMINAR que a Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária - FEPAGRO promova a recuperação integral dos danos ambientais ocorridos na área degradada, em função das queimadas, mediante a execução de Plano de Recuperação da Área Degradada (PRAD), a ser elaborado por profissional habilitado, o qual deverá ser submetido à prévia aprovação pelos órgãos competentes e, posteriormente, executado de acordo com o cronograma estabelecido.

A obrigação de fazer deverá ser cumprida pela ré no prazo de 60 (sessenta) dias, contados a partir do trânsito em julgado da presente sentença, sob pena de multa diária, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 11 da Lei nº 7.347/1985, a ser revertida em prol do Fundo Nacional de Direitos Difusos.

Demanda isenta de custas (art. 4º, I, III e IV, da Lei n.º 9.289/1996).

Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos do art. 18 da Lei n.º 7.347/1985 (AgRg no REsp 1386342/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/03/2014, DJe 02/04/2014).

Tendo em vista o decaimento parcial do autor da presente ação civil pública, impõe-se o reexame necessário, aplicando-se, por analogia, o art. 19 da Lei 4.717/65."

A sentença foi confirmada em reexame necessário pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, em acórdão assim ementado:

AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REEXAME NECESSÁRIO. DEGRADAÇÃO AMBIENTAL. QUEIMADA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. REPARAÇÃO.
1. O meio ambiente ecologicamente equilibrado é protegido pelo art. 225 da CRFB/88, e sua proteção é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme art. 23, VI e VII, da CRFB/88. Cabe a cada uma destas esferas de governo, nos termos da lei e do interesse preponderante, fiscalizar, licenciar e, em havendo necessidade, autuar, com o objetivo de promover a proteção do meio ambiente e combater a poluição, bem como preservar a floresta, a fauna e a flora, remetendo a fixação das normas de cooperação para o âmbito normativo de Leis Complementares.
2. O dano ambiental é, por expressa previsão legal, de responsabilidade objetiva, impondo-se ao poluidor o dever de indenizar para, posteriormente, se for o caso, ir cobrar de terceiro que porventura sustente ter responsabilidade pelo fato.
3. Comprovada a atuação ilícita da FEPAGRO, consistente, no mínimo, em indevida omissão, bem como os danos ambientais que dela decorreram diretamente e o nexo de causalidade.
4.  Se a recuperação in natura é suficiente para a recomposição do meio ambiente afetado, não há razão para impor, cumulativamente, o dever de indenizar em pecúnia o dano perpetrado pelo infrator.

Não houve recursos.

O trânsito em julgado foi registrado em 11/03/2017.


 

Última atualização: 
21/03/2021

Com contribuições de Celso Valle e Marcella Ferraro.


 


 

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